Carta ao Editor

O dilema do TDAH na era da desinformação

The ADHD dilemma in the age of misinformation

El dilema del TDAH en la era de la desinformación

1. Eduardo Morales Sousa
e-mail orcid Lattes

Filiação dos autores:

1 [Especializando, Universidade Federal Fluminense, UFF, Niterói, RJ, Brasil]

Editor-chefe responsável pelo artigo: Leonardo Baldaçara

Contribuição dos autores segundo a Taxonomia CRediT: Sousa EM [1,7,13,14]

Conflito de interesses: declaram não haver

Fonte de financiamento: declaram não haver

Parecer CEP: não se aplica

Recebido em: 17/08/2024 | Aprovado em: 27/08/2024 | Publicado em: 14/09/2024

Como citar: Sousa EM. O dilema do TDAH na era da desinformação. Debates em Psiquiatria, Rio de Janeiro. 2024;14:1-4. https://doi.org/10.25118/2763-9037.2024.v14.1316

Resumo

Esta carta tem visa abordar a crescente propagação de informações falsas, fenômeno observado entre todas as áreas da medicina atualmente, mas em especial no que diz respeito ao transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Entraves como autodiagnóstico e banalização do transtorno tem sido uma questão cada vez mais frequente, sendo capaz de dificultar o percurso do paciente até chegar em um diagnóstico definitivo, dado por profissional habilitado. Com dados internacionais sobre o tema, é possível também fazer um recorte e observar o impacto da desinformação até mesmo na realidade local.

Palavras-chave: psiquiatria, redes sociais online, transtorno do déficit de atenção com hiperatividade, TDAH, desinformação.

Abstract

This letter aims to address the growing spread of false information, a phenomenon observed across all areas of medicine today, but especially regarding attention deficit hyperactivity disorder (ADHD). Obstacles such as self-diagnosis and trivialization of the disorder have been an increasingly frequent issue, capable of complicating the patient's journey until reaching a definitive diagnosis, given by a qualified professional. With international data on the topic, it is also possible to take a look and observe the impact of misinformation even on the local reality.

Keywords: psychiatry, online social networking, attention deficit disorder with hyperactivity, ADHD, misinformation.

Resumen

Esta carta tiene como objetivo abordar la creciente difusión de información falsa, un fenómeno que se observa actualmente en todas las áreas de la medicina, pero especialmente en lo que respecta al trastorno por déficit de atención con hiperactividad (TDAH). Obstáculos como el autodiagnóstico y la banalización del trastorno han sido un tema cada vez más frecuente, capaz de complicar el camino del paciente hasta llegar a un diagnóstico definitivo, dado por un profesional cualificado. Con datos internacionales sobre el tema, también es posible echar un vistazo y observar el impacto de la desinformación incluso en la realidad local.

Palabras clave: psiquiatría, redes sociales en línea, trastorno por déficit de atención con hiperactividad, TDAH, desinformación.



Prezados editores e leitores do periódico Debates em Psiquiatria

Nos últimos anos, vimos uma crescente atenção sobre temas da psiquiatria. Depressão, burnout, transtorno de ansiedade generalizada são alguns dos termos presentes em conversas coloquiais entre grupos da sociedade. Para além destes citados, alguns transtornos de neurodesenvolvimento, em especial o transtorno do espectro autista (TEA) e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) têm sido amplamente comentados - no entanto, poucas vezes com o devido cuidado.

Em estudo conduzido em 2021 , foram analisados vídeos na plataforma TikTok, uma das de maior alcance atualmente, em especial entre jovens. À época da pesquisa, vídeos com a #adhd (equivalente a #tdah em português) contabilizavam 4.3 bilhões de visualizações. Após refinamento da pesquisa, dentre os vídeos que cumpriram critérios de elegibilidade, 52% apresentavam desinformação, 27% experiências pessoais e apenas 21% foram considerados adequados para o propósito de educação em saúde. Dentre as falhas observadas, destacam-se vídeos em que apresentavam sintomas tais como ansiedade, depressão e dissociação como patognomônicos para portadores de TDAH.

Estudo com propósito similar, publicado em 2024 , avaliou como criadores de conteúdo que se proclamavam portadores de TDAH influenciavam para a formação de um conceito de identidade tanto individual quanto coletivo acerca do TDAH. Por vezes, a desinformação aparenta vir como uma forma de buscar validação/pertencimento ao invés de divulgação de informações de saúde de qualidade.

A desinformação, no entanto, não ocorre apenas em redes sociais. Mídias tradicionais, como revistas, também têm sido responsáveis por divulgar informações erradas. É o caso de reportagem do Correio Braziliense , que ao descrever estudo que avalia impacto do uso de telas chegou a extrapolar e contrariar o próprio artigo ao qual se referia, induzindo a população a acreditar que seria possível desenvolver TDAH com o abuso de tempo passado no celular.

Por vezes esbarrando em estigmas e por outras passando por banalização do tema, as mídias tradicionais e redes sociais têm falhado em trazer informações de qualidade. Desta forma, mais do que nunca, deve-se fazer um movimento, vindo da parte acadêmica (sejam psiquiatras, neurologistas, pediatras e equipe multidisciplinar) para educar a sociedade sobre o tema com informações seguras, visando auxiliar pacientes e familiares que necessitem de suporte. Não há solução pronta, mas é possível debatermos sobre responsabilidade na divulgação de informação em saúde, assim como já se tem visto avanços em casos de divulgação de suicídio, por exemplo .

Dentre os bons exemplos, cabe ainda ressaltar a parceria firmada entre empresas como Amazon e Associação Brasileira de Psiquiatria: após parceria em 2020, as instituições se uniram novamente, em anúncio realizado em 13/08/2024, visando fornecer informações confiáveis sobre o TDAH . Tal medida pode servir como modelo para expandir o alcance de informações confiáveis, minimizando o impacto da atual disseminação de conteúdo de qualidade duvidosa.

Referências

1. Yeung A, Ng E, Abi-Jaoude E. TikTok and attention-deficit/hyperactivity disorder: a cross-sectional study of social media content quality. Can J Psychiatry. 2022;67(12):899-906. https://doi.org/10.1177/07067437221082854 - PMID:35196157 PMCID:PMC9659797

2. Leveille AD. "Tell me you have ADHD without telling me you have ADHD": neurodivergent identity performance on TikTok. Social Media + Society, 10(3). https://doi.org/10.1177/20563051241269260

3. Dornelas H. Adultos que passam horas no celular podem desenvolver TDAH, mostra estudo. Brasília: Correio Braziliense; 2024. https://www.correiobraziliense.com.br/ciencia-e-saude/2024/01/6795455-adultos-que-passam-horas-no-celular-podem-desenvolver-tdah-mostra-estudo.html

4. Associação Brasileira de Psiquiatria. Comportamento suicida: conhecer para prevenir. Dirigido para profissionais da imprensa. Publicações ABP documentos e vídeos = ABP Publications documents and videos. 1º de setembro de 2022. https://doi.org/10.25118/issn.2965-1832.2022.590

5. Gois A. No Recife, Amazon anuncia parceria entre Alexa e Associação Brasileira de Psiquiatria. Recife: Diário de Pernambuco; 2024. https://www.diariodepernambuco.com.br/ultimas/2024/08/no-recife-amazon-anuncia-parceria-entre-alexa-e-associacao-brasileira.html

Debates em Psiquiatria, Rio de Janeiro. 2024