Filiação dos autores:
1,2 [Graduandos, Medicina, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP, Sorocaba, SP, Brasil];
3 [Professor, Coordenador do Curso de Medicina, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP, São Paulo, SP, Brasil.
Editor-chefe responsável pelo artigo: Leonardo Baldaçara
Contribuição dos autores segundo a Taxonomia CRediT: Campos L, Cyrillo I [5,13,14], Henna Neto J [1,10,13]
Conflito de interesses: declaram não haver
Fonte de financiamento: declaram não haver
Parecer CEP: não se aplica
Recebido em: 30/09/2024 | Aprovado em: 07/10/2024 | Publicado em: 15/11/2024
Como citar: Campos L, Cyrillo I, Henna Neto J. Desenvolvimento e avaliação de material alternativo de solução coloide de sulpirida para tratamento de esquizofrenia. Debates em Psiquiatria, Rio de Janeiro. 2024;14:1-8. https://doi.org/10.25118/2763-9037.2024.v14.1351
Introdução: A sulpirida é um agente antipsicótico de primeira geração usado para o tratamento de esquizofrenia. Sua administração é realizada por via oral, porém está associada a muitos efeitos colaterais. Alguns deles são constipação, sedação, insônia, ganho ponderal, acatisia e parkinsonismo. Por causa desses efeitos, a adesão ao tratamento com a sulpirida torna-se um grande desafio. Um método alternativo para administração de sulpirida seria então através da aplicação de um gel na pele do paciente. Tal gel pode oferecer muitas vantagens sobre as formas tradicionais de administração, como redução dos efeitos colaterais, resultando em uma maior adesão ao tratamento e consequente melhora dos sintomas positivos e negativos da esquizofrenia. Objetivo: O objetivo deste estudo é desenvolver um sistema de administração alternativo de sulpirida e avaliar sua liberação a fim de se obter uma alternativa para a administração oral que possa ser incorporada à prática clínica no atendimento a pacientes esquizofrênicos. Métodos: Realizamos uma solução de álcool polivinílico com a sulpirida nas concentrações do fármaco em 50 mg e 100 mg. Após a formação das soluções, separamos alíquotas, as quais foram analisadas por um espectrofotômetro que registrou a liberação da sulpirida na solução. Resultados: A solução de sulpirida de 50 mg obteve uma liberação de aproximadamente 50%, enquanto a solução de 100 mg obteve uma liberação de mais de 80%, ambas atingindo um platô após a primeira hora do estudo. Conclusão: A sulpirida se mostra um fármaco possível de ser utilizado em uma formulação transdérmica. Contudo, são necessários mais estudos para obter uma liberação prolongada.
Palavras-chave: esquizofrenia, sulpirida, administração cutânea.
Introduction: Sulpiride is a first-generation antipsychotic agent used for schizophrenia treatment. Its administration is oral, but is related to many side effects. Some of them are constipation, sedation, insomnia, weight gain, akathisia and parkinsonism. Because of those side effects, sulpiride's treatment adhesion becomes a great challenge. An alternative method for sulpiride's administration would be its application through the patient's skin. Such gel could offer many advantages over the traditional forms of drug administration, such as reduction in side effects, resulting in a greater treatment adhesion and consequently improvement on both positive and negative symptoms of schizophrenia. Objective: The purpose of this study is to develop an alternative administration system for sulpiride and evaluate its release in order that it can be incorporated to clinical practice in schizophrenic patients. Methods: We formulated a polivinilic alcohol and sulpiride solution, with the drug's concentrations at 50 mg and 100 mg. After the making of the solutions, we separated aliquots which were analyzed by a spectrophotometer that recorded the sulpiride's release. Results: The sulpiride solution of 50 mg got a release of, approximately, 50%, while the 100 mg solution got over 80% of release, both hitting a plateau after the study's first hour. Conclusion: Sulpiride shows itself as a drug that can be used in a transdermal formulation. However, more studies are needed so it can be released extendedly.
Keywords: schizophrenia, sulpiride, cutaneous administration.
Introducción: La sulpirida es un agente antipsicótico de primera generación utilizado para el tratamiento de la esquizofrenia. Se administra por vía oral, pero se asocia con muchos efectos secundarios. Algunos de ellos son el estreñimiento, la sedación, el insomnio, el aumento de peso, la acatisia y el parkinsonismo. Debido a estos efectos, la adherencia al tratamiento con sulpirida se convierte en un desafío importante. Un método alternativo para administrar sulpirida sería mediante la aplicación de un gel en la piel del paciente. Un gel de este tipo puede ofrecer muchas ventajas sobre las formas tradicionales de administración, como la reducción de los efectos secundarios, lo que se traduce en una mayor adherencia al tratamiento y la consiguiente mejora de los síntomas positivos y negativos de la esquizofrenia. Objetivo: El objetivo de este estudio es desarrollar un sistema de administración alternativo de sulpirida y evaluar su liberación para obtener una alternativa a la administración oral que pueda incorporarse a la práctica clínica en el cuidado de pacientes esquizofrénicos. Métodos: Hicimos una solución de alcohol polivinílico con sulpirida en concentraciones de fármaco de 50 mg y 100 mg. Una vez formadas las soluciones, separamos alícuotas, que fueron analizadas por un espectrofotómetro que registró la liberación de sulpirida en la solución. Resultados: La solución de sulpirida de 50 mg logró una liberación de aproximadamente el 50 %, mientras que la solución de 100 mg logró una liberación de más del 80 %, alcanzando ambas una meseta después de la primera hora del estudio. Conclusión: La sulpirida parece ser un fármaco que puede usarse en una formulación transdérmica. Sin embargo, se necesitan más estudios para obtener una liberación prolongada.
Palabras clave: esquizofrenia, sulpirida, administración cutánea .
A esquizofrenia é definida como uma psicose crônica idiopática de causa multifatorial, em que fatores genéticos e ambientais demonstram implicar em aumento no risco de seu desenvolvimento. As primeiras manifestações prodrômicas aparecem, normalmente, de forma insidiosa e antecedem os sintomas característicos. Assim, perda de energia, negligência com aparência pessoal e higiene, humor depressivo e isolamento, se apresentam por algumas semanas ou até meses antes de sintomas mais específicos, como alucinações e delírios, transtornos de comportamento e fala, perturbação do afeto e déficits cognitivos. O comportamento catatônico e a anedonia física e social, foram propostas como características cardinais da doença. Desse modo, existe, concomitantemente, a perda de prazeres como comer, beber e cantar- anedonia física- e de prazeres como estar com amigos e outras pessoas- anedonia social. Portadores de esquizofrenia com déficit cognitivo generalizado tendem a ter desempenhos mais baixos em diversos testes cognitivos, quando comparados com controles normais.
A sulpirida é um antipsicótico de primeira geração, da classe das benzamidas, cuja eficácia terapêutica resulta de sua ação como antagonista dos receptores dopaminérgicos D2, D3 e D4. O fato da sulpirida não atuar sobre os receptores D1, histamínicos, adrenérgicos, serotoninérgicos, colinérgicos e GABAérgicos, constitui-se em uma vantagem clínica da mesma. Assim, a indicação da sulpirida para Esquizofrenia Refratária, quer isolada, quer em associação, é observada muito provavelmente por essa característica.
A forma de administração padrão da sulpirida disponível atualmente é por via oral, sendo a dose recomendada para o tratamento da esquizofrenia cerca de 400 - 800 mg/dia, enquanto que para transtornos depressivos é de 150 - 300 mg/dia. A sulpirida apresenta efeitos colaterais motores, elevações na prolactina e piora dos sintomas negativos e cognitivos (síndrome do déficit induzido por neuroléptico). Além disso, sua ação anticolinérgica pode causar sedação, visão turva e ganho ponderal. Por fim, ao bloquear os receptores alfa-1 adrenérgicos pode provocar tontura, sedação e hipotensão.
Dessa forma, esses efeitos indesejáveis, levam a uma menor adesão ao tratamento e poderiam ser evitados com uma nova forma de administração. Além desse benefício a absorção da sulpirida ocorre no lentamente no trato gastrointestinal, apresentando seu pico de concentração entre 4 e 6 horas. Sua biodisponibilidade também é reduzida, cerca de 27 ± 9%, quando administrado por via oral. Sendo assim, a administração em forma de gel contribuiria também para evitar essa metabolização, proporcionando uma maior oferta do medicamento ao paciente.
Portanto, considerando os efeitos adversos importantes da sulpirida, sobretudo os gastrointestinais, e sua redução de oferta após metabolismo de primeira passagem, acreditamos que uma nova forma de administração poderá atenuar alguns desses sintomas desvantajosos e, consequentemente, aumentar a aceitação ao tratamento.
Diante dessas características, buscamos com este projeto formular uma via alternativa de veiculação para a sulpirida, por meio da administração transdérmica, através de um gel.
O objetivo desse estudo é desenvolver um gel de sulpirida para obter uma forma de liberação modificada do fármaco, a fim de evitar os e efeitos colaterais da forma farmacêutica padrão por via oral.
Utilizamos uma solução de álcool polivinílico (PVA) à concentração de 10%, onde foi utilizado 3 g do polímero em 30 mL de água destilada mantido em rotação com temperatura de aproximadamente 80 °C até que o mesmo fosse diluído, formando um hidrogel homogêneo.
Foram pesados 50 mg e 100 mg e do pó da sulpirida para ser incorporada nas membranas de PVA. Cada concentração do fármaco foi homogeneizada em 10 mL de solução de PVA, vertidas numa placa de teflon e congeladas no freezer (-20°C) por 24h. Após as 24h de congelamento, o material foi retirado do freezer e deixado em temperatura ambiente por aproximadamente 8 horas. Esse processo de congelamento e descongelamento foi repetido 2 vezes para reticulação completa do PVA.
Para avaliar a liberação da sulpirida, as amostras de PVA + sulpirida com diferentes concentrações do fármaco, contendo 1x1 cm de tamanho foram imersas em 6 mL de solução NaOH, seguidas em temperatura a 37 °C. Alíquotas de 3 mL foram coletadas e substituídas pelo mesmo volume em intervalos de tempos pré-determinado durante as primeiras horas (total de 5 horas). A liberação do fármaco foi medida em um espectrofotômetro UV (Femto Cirrus 80, São Paulo, Brasil) a 246 nm. A quantificação de sulpirida liberado foi calculada utilizando a média obtida em triplicata, comparada a uma curva padrão contendo concentrações conhecidas. Os resultados foram então compilados no software Microsoft Excel para a posterior obtenção do gráfico da liberação.
A partir dos dados obtidos com o estudo de liberação, notamos que a incorporação da sulpirida no PVA foi bem sucedida e que de fato ocorreu sua liberação em ambas as concentrações estudadas, havendo uma liberação de mais de 80% do fármaco na concentração de 100 mg e de aproximadamente 50% na concentração de 50 mg, como pode ser visto no Gráfico 1.
Figure 1. Illustrates the PRISMA flow diagram
Contudo, devido às propriedades hidrofílicas intrínsecas ao PVA, a liberação não conseguiu ser sustentada, havendo um efeito de liberação “em explosão” na primeira hora do estudo, atingindo em seguida um platô.
Diante dos resultados obtidos, que a sulpirida se mostra um fármaco passível de escolha para administração transdérmica em pacientes esquizofrênicos, devido à sua concentração durante a liberação ter sido maior que sua biodisponibilidade por via oral relatada na literatura. Contudo, por conta das características hidrofílicas do PVA, notamos uma liberação mais rápida do que a desejada, exigindo a adição de outras substâncias hidrofóbicas que diminuam essa propriedade, a fim de prolongar a liberação do fármaco, tornando essa via uma forma mais viável de tratamento.
Sugerimos, portanto, com os nossos resultados, a realização de maiores pesquisas sobre as apresentações transdérmicas dos fármacos antipsicóticos, bem como de novas formulações com o PVA associado a outros materiais a fim de aumentar e tornar mais eficiente o arsenal terapêutico para a esquizofrenia.
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