Artigo de Revisão

Perfis sociodemográficos e clínicos de adolescentes com autolesão não suicida

Sociodemographic and clinical profiles of adolescents with non-suicidal self-injury

Perfiles sociodemográficos y clínicos de adolescentes con autolesión no suicida

1. Jadiel Luis da Silva
e-mail orcid Lattes

2. Luiza Seib Malheiros
orcid Lattes

3. Luíza Andrade de Oliveira
orcid Lattes

4. Mônica Vilela Heimer
orcid Lattes

5. José Eudes de Lorena Sobrinho
orcid Lattes

Filiação dos autores:

1,2,3 [Mestrandos em Hebiatria, Universidade de Pernambuco, UPE, Recife, PE, Brasil]

4 [Doutora em Odontologia, Universidade de Pernambuco, UPE, Recife, PE, Brasil]

5 [Doutor em Saúde Pública, Universidade de Pernambuco, UPE, Recife, PE, Brasil]

Editor-chefe responsável pelo artigo: Marsal Sanches

Contribuição dos autores segundo a Taxonomia CRediT: Silva JL [1,2,3,5,6,7,11,12,13], Malheiros LS, Oliveira LA [1,9,11,13,14], Heimer MV [2,6,10,11], Lorena Sobrinho JE [2,10,11]

Conflito de interesses: declaram não haver

Fonte de financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, Brasil (CAPES). Código de Financiamento 001

Parecer CEP: não se aplica

Recebido em: 16/12/2024 | Aprovado em: 04/02/2025 | Publicado em: 22/02/2025

Como citar: Silva JL, Malheiros LS, Oliveira LA, Heimer MV, Lorena Sobrinho JE. Perfis sociodemográficos e clínicos de adolescentes com autolesão não suicida. Debates em Psiquiatria, Rio de Janeiro. 2025;15:1-22. https://doi.org/10.25118/2763-9037.2025.v15.1395

Resumo

Introdução: Este estudo visa coletar dados sobre as características sociodemográficas e clínicas de adolescentes brasileiros vítimas de violência autoinfligida. Objetivo: Analisar as características sociodemográficas e clínicas dos adolescentes brasileiros que estão envolvidos neste tipo de violência auto infligida, gerando informações científicas que subsidiem política públicas de cuidado para esta população. Metodologia: Realizou-se uma revisão de escopo em 8 fontes de pesquisa. Foram encontrados 681 artigos, dos quais 21 atenderam aos critérios de elegibilidade. A seleção foi realizada de forma independente por três pesquisadores e os conflitos foram resolvidos por meio de discussões para chegar a um consenso. O estudo priorizou fontes com qualidade nas evidências científicas e buscou incluir dados específicos da população brasileira. Seis artigos foram selecionados para análise Resultados: Tal comportamento foi predominante no sexo feminino, na faixa etária 10 a 14 anos, associação com uso de álcool e outras drogas, impulsividade elevada, bullying e recorrência frequente dos atos. Discussão: A literatura científica aponta a preocupação com lesões autoprovocadas devido à elevada associação com o suicídio, a sua correlação com o uso de substâncias, depressão e traços de personalidade borderline. Conclusão: Evidencia-se a necessidade de estudos mais robustos e a ausência de pesquisas sobre autolesões não suicidas em adolescentes brasileiros durante e após a pandemia de COVID-19.

Palavras-chave: comportamento adolescente, psiquiatria, comportamento autolesivo, saúde pública, adolescente.

Abstract

Introduction: This study aims to collect data on the sociodemographic and clinical characteristics of Brazilian adolescents who are victims of self-inflicted violence. Objective: To analyze the sociodemographic and clinical characteristics of Brazilian adolescents who are involved in this type of self-inflicted violence, generating scientific information that supports public care policies for this population. Methodology: A scoping review was conducted across eight research sources. A total of 681 articles were identified, of which 21 met the eligibility criteria. The selection was carried out independently by three researchers, and conflicts were resolved through discussions to reach a consensus. The study prioritized sources with high-quality scientific evidence and sought to include data specific to the Brazilian population. Six articles were selected for analysis. Results: This behavior was predominant in females, aged 10 to 14 years, and was associated with alcohol and drug use, high impulsivity, bullying, and frequent recurrence of the acts. Discussion: Scientific literature highlights concern over self-inflicted injuries due to their strong association with suicide, correlation with substance use, depression, and borderline personality traits. Conclusion: There is a clear need for more robust studies and a noticeable lack of research on non-suicidal self-injuries among Brazilian adolescents during and after the COVID-19 pandemic.

Keywords: adolescent behavior, psychiatry, self-injurious behavior, public health, adolescent.

Resumen

Introducción: Este estudio tiene como objetivo recopilar datos sobre las características sociodemográficas y clínicas de adolescentes brasileños víctimas de violencia autoinfligida. Objetivo: Analizar las características sociodemográficas y clínicas de los adolescentes brasileños involucrados en este tipo de violencia autoinfligida, generando información científica que sustente políticas públicas de atención a esta población. Metodología: Se realizó una revisión de alcance en ocho fuentes de investigación. Se identificaron un total de 681 artículos, de los cuales 21 cumplían con los criterios de elegibilidad. La selección se llevó a cabo de forma independiente por tres investigadores, y los conflictos se resolvieron mediante discusiones para llegar a un consenso. El estudio priorizó fuentes con evidencia científica de calidad y buscó incluir datos específicos de la población brasileña. Se seleccionaron seis artículos para el análisis. Resultados: Este comportamiento fue predominante en mujeres, en el grupo de edad de 10 a 14 años, y estuvo asociado con el consumo de alcohol y otras drogas, alta impulsividad, bullying y recurrencia frecuente de los actos. Discusión: La literatura científica señala la preocupación por las lesiones autoinfligidas debido a su alta asociación con el suicidio, su correlación con el consumo de sustancias, la depresión y los rasgos de personalidad borderline. Conclusión: Se evidencia la necesidad de estudios más sólidos y la ausencia de investigaciones sobre las autolesiones no suicidas en adolescentes brasileños durante y después de la pandemia de COVID-19.

Palabras clave: comportamiento adolescente, psiquiatría, comportamiento autolesivo, salud pública, adolescente.

Introdução

De acordo com a American Psychiatric Association [1

1. American Psychiatric Association. Diagnostic and statistical manual of mental disorders: DSM-5. 5th rev. ed. Washington: American Psychiatric Association; 2022. https://doi.org/10.1176/appi.books.9780890425787
], o critério A do transtorno de autolesão não suicida é definido como o indivíduo haver se envolvido , no último ano, o em 5 ou mais dias, em danos auto-infligidos intencionais à superfície de seu corpo de um modo que possa induzir sangramento, hematomas ou dor (por exemplo: corte, queimadura, esfaqueamento, pancada, fricção excessiva), com a expectativa de que a lesão leve apenas a danos físicos leves ou moderados (ou seja, não há intenção suicida). Este também chamado de automutilação cresceu nos últimos anos especialmente em adolescente [2
2. Monteiro RA, Bahia CA, Paiva EA, Sá NNB, Minayo MCS. Hospitalizations due to self-inflicted injuries - Brazil, 2002 to 2013. Ciênc Saude Coletiva. 2015;20(3):689–99. https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.16282014
]
.

A automutilação tornou-se um grave problema de saúde pública, com elevados gastos orçamentários e risco elevado de suicídio nesta faixa etária mais vulnerável [3

3. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
]. Além disto, os elevados impactos sociais e psíquicos relacionados, como abuso de substância [4
4. Brañas MJAA, Croci MS, Murray GE, Choi-Kain LW. The relationship between self-harm and suicide in adolescents and young adults. Psychiatr Ann. 2022;52(8):311-7. https://doi.org/10.3928/00485713-20220715-01
]
e desenvolvimento de risco para ansiedade e depressão [5
5. Wilkinson P, Kelvin R, Roberts C, Dubicka B, Goodyer I. Clinical and psychosocial predictors of suicide attempts and nonsuicidal self-injury in the Adolescent Depression Antidepressants and Psychotherapy Trial (ADAPT). Am J Psychiatry. 2011;168(5):495-501. https://doi.org/10.1176/appi.ajp.2010.10050718
]
. Desregulação emocional e elevada reatividade são características psíquicas associadas [6
6. Bandeira BES, Santos Júnior A, Dalgalarrondo P, Azevedo RCS, Celeri EHVR. Nonsuicidal self-injury in undergraduate students: a cross-sectional study and association with suicidal behavior. Psychiatry Res. 2022;318:114917. https://doi.org/10.1016/j.psychres.2022.114917
]
.

Estatisticamente este comportamento é mais frequente em adolescentes do sexo feminino na fase inicial de suas vidas [7, 

7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
8
8. Pattussi MP, Lalloo R, Bassani DG, Olinto MT. The role of psychosocial, behavioural and emotional factors on self-reported major injuries in Brazilian adolescents: a case-control study. Injury. 2008;39(5):561-9. https://doi.org/10.1016/j.injury.2007.11.013 PMID:18339390
]. Porém a subnotificação deste ato levanta questionamentos acerca da real característica sociodemográfica destes [9
9. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
]
.

Cabe ressaltar que existem 3 níveis de gravidade: leve, moderado e grave, tendo estes desfechos distintos [10

10. Fonseca PHN, Silva AC, Araújo LMC, Botti NCL. Autolesão sem intenção suicida entre adolescentes. Arq Bras Psicol. 2028;70(3):246-58. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672018000300017
]. O DSM-5 conceitua estas autoagressões na secção III, no grupo de condições que necessitam de mais estudos [11
11. Ribeiro ACOP, Leite RFD, Couto VVD. Autolesão em estudantes adolescentes de uma escola pública pública. Rev Família Ciclos de Vida e Saude no Contexto Social. 2022;10(1):135-44. https://doi.org/10.18554/refacs.v10i1.5000
]
.

Portanto, este artigo tem por objetivo analisar as características sociodemográficas e clínicas dos adolescentes brasileiros que estão envolvidos neste tipo de violência auto infligida, gerando informações científicas que subsidiem política públicas de cuidado para esta população.

Metodologia

Esta revisão de escopo baseou-se nas 5 etapas de Arksey e O’Malley as quais são: 1. Identificar a questão de pesquisa, 2. Identificar estudos relevantes, 3. Selecionar os estudos, 4. Organizar os dados e agrupar, resumir e 5. relatar os resultados [12

12. Arksey H, O'Malley L. Scoping studies: towards a methodological framework. Int J Soc Res Methodol. 2005;8(1):19-32. https://doi.org/10.1080/1364557032000119616
].

Inicialmente identificamos a questão dos atos auto lesivos sem intenção de suicídio nos adolescentes com um importante agravo a saúde dos mesmos, seguindo para relevância que o tema vem ganhando graças ao aumento expressivo do número de casos. Em seguida, foram selecionados os estudos no período de maio a junho de 2023, caracterizou-se os achados, finalizando-se com a sumarização e publicação dos resultados. Apesar de tentar ser o mais abrangente possível, esta revisão mostrou como limitação metodológica o fato de poder não ter identificado todas as publicações sobre o tema disponíveis, por se restringir a três bases de dados. Além disso, a consulta na literatura cinzenta foi limitada, por se tratar de uma revisão internacional sem delimitação de países. Essa situação dificultou, por sua vez, a consulta em websites de organizações e entidades de pesquisa de cada país, em que poderiam ser encontrados documentos sobre o tema abordado.

Visando fortalecer o rigor metodológico optou-se por seguir o checklist Prisma adaptado para revisão de Escopo (Prisma-ScR) [13

13. Tricco AC, Lillie E, Zarin W, O'Brien KK, Colquhoun H, Levac D, Moher D, Peters MDJ, Horsley T, Weeks L, Hempel S, Akl EA, Chang C, McGowan J, Stewart L, Hartling L, Aldcroft A, Wilson MG, Garritty C, Lewin S, Godfrey CM, Macdonald MT, Langlois EV, Soares-Weiser K, Moriarty J, Clifford T, Tunçalp Ö, Straus SE. PRISMA extension for scoping reviews (PRISMA-ScR): checklist and explanation. Ann Intern Med. 2018;169(7):467-73. https://doi.org/10.7326/m18-0850 PMID:30178033
]. Além disto, os métodos foram registrados na Open Science Framework.

A pergunta norteadora foi construída usando-se o acrônimo PICO (População, Interesse e Contexto), gerando o seguinte questionamento: “Quais as características sociodemográficas e clínicas dos adolescentes brasileiros envolvidos em autolesão não suicida?”. Na estratégia de busca não houve restrição de idiomas ou período.

Buscou-se em 8 bancos de dados: APA psyncnet, LILACS, MEDLINE, Pubmed, Embase, Web of Science, The cochraine library, Scopus. Como limitações, apontou-se as limitações do estudo, o que se encontra também em conformidade com o que orienta o Instituto Joana Briggs (JBI) e o PRISMA-ScR.

Durante a etapa de busca e seleção de artigos, identificamos a impossibilidade de localizar um estudo potencialmente relevante. O referido estudo, intitulado "Comportamento autolesivo em adolescentes de escola pública", de Santos J.H.R.M., Pires C.F., Pereira D.M., Silva D.L.D., publicado no Volume 17, Edição 2, em 01 de janeiro de 2020, não pôde ser recuperado, apesar de exaustivas incursões em bases de dados científicas, tentativas de contato com os autores e o emprego de múltiplos termos de busca. A ausência deste trabalho pode ser atribuída a restrições de acesso ou a imprecisões nas referências originais. Para contornar essa limitação, optou-se por excluí-lo da seleção final, porém, registrou-se a tentativa de busca em prol da transparência metodológica. Contudo, é importante reconhecer que essa ausência pode impactar a abrangência das conclusões desta revisão.

Como exemplo de chave de busca cita-se: Pubmed ((Adolescent OR Adolescents OR Adolescence OR Teens OR Teen OR Teenagers OR Teenager OR Youth OR Youths) AND (brazil)) AND (Self-Injurious Behavior OR, Behavior, Self-Injurious OR Self Injurious Behavior OR, Self-Injurious Behaviors OR, Intentional Self Injury OR Intentional Self Injuries OR, Self Injury, Intentional OR, Intentional Self Harm OR, Self Harm, Intentional OR, Nonsuicidal Self Injury OR, Nonsuicidal Self Injuries OR, Self Injury, Nonsuicidal OR, Deliberate Self-Harm OR, Deliberate Self Harm OR, Self-Harm, Deliberate OR, Self-Injury OR, Self Injury OR, Non-Suicidal Self Injury OR, Non Suicidal Self Injury OR, Non-Suicidal Self Injuries OR, Self Injury, Non-Suicidal OR, Self Harm OR, Harm, Self OR, Self-Destructive Behavior OR, Behavior, Self-Destructive OR, Self Destructive Behavior OR, Self-Destructive Behaviors). Pesquisou-se por descritores DeCS/MeSH e seus sinônimos possíveis. Não foi aplicado filtro.

Como critérios de inclusão da revisão, foram elegíveis os artigos publicados que abordassem adolescentes brasileiros de 10 a 19 anos, seguindo o conceito da OMS sobre adolescência, que estivessem envolvidos em atos auto lesivos sem intenção de suicídio. E para serem excluídos utilizou-se o critério de artigos exclusivamente qualitativos.

O estudo priorizou fontes com qualidade nas evidências científicas e buscou incluir dados específicos da população brasileira. A seleção dos estudos foi realizada de acordo com os itens de relatório preferidos para revisões sistemáticas e Declaração de meta-análise: 3 pesquisadores independentes examinaram todos os títulos e resumos, aplicando os critérios de elegibilidade. Discordâncias foram resolvidas em discussões entre os mesmos. Desta forma, selecionou-se 6 trabalhos para análise. A descrição detalhada desse processo encontra-se no diagrama de fluxo PRISMA-ScR [Figura 1].

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O Gráfico 1 apresenta a evolução temporal da quantidade de publicações referentes ao tema, utilizando os descritores mencionados. Os resultados demonstram que, apesar de uma busca extensiva, há uma escassez de trabalhos publicados sobre o assunto. Além disso, observa-se uma tendência de aumento na abordagem deste tema ao longo dos últimos 15 anos, refletida por um crescimento significativo no número de publicações.

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Devido à variedade de tipos de estudos e dificuldade de padronização dos mesmos, os dados foram analisados de forma descritiva, agrupando-se e resumindo as informações semelhantes achadas dentro dos artigos. O Quadro 1 apresenta as principais características dos artigos incluídos nesta revisão.

Resultados

Perfil dos artigos incluídos na revisão

Seis artigos foram incluídos na presente revisão: cinco estudos transversais e um estudo caso-controle. O período relatado nestes artigos avaliados variou de 2002 a 2019. Predominantemente, os estudos estiveram restritos à esfera municipal, com apenas dois artigos abordando um panorama nacional [9, 

9. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
14
14. Aragão CMC, Mascarenhas MDM. Temporal trend of adolescent intentional self-harm notifications in the school environment, Brazil, 2011-2018. Epidemiol Serv Saude. 2022;31(1):e2021820. https://doi.org/10.1590/s1679-49742022000100028 PMID:35544870
]. O ambiente escolar se mostrou o principal local de captação dos adolescentes para as pesquisas. Apenas um estudo realizou análise documental de prontuários em um Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPSI) [15
15. Santo MAS, Bedin LM, Dell’Aglio DD. Self-injurious behavior and factors related to suicidal intent among adolescents: a documentary study. Psico-USF. 2022;27(2):357-68. https://doi.org/10.1590/1413-82712022270212
]
.

Observou-se certa heterogeneidade nos delineamentos metodológicos empregados nos artigos. Os diferentes critérios para classificação de ‘’Comportamento autolesivo sem intenção suicida’’ utilizadas nos estudos, bem como os diferentes materiais usados para coleta de dados, influenciaram as variáveis extraídas para a revisão e, consequentemente, os resultados expostos, tendo em vista a dificuldade de análises comparativas pela não padronização das metodologias de pesquisa sobre essa temática.

Evidenciou-se, na literatura elegível, dois critérios de classificação para ‘’Comportamento autolesivo sem intenção suicida’’: o primeiro, do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V), e o segundo, da Escala de Comportamento de Autolesão (ECA), que se diferenciam, sobretudo, a partir da preconização por parte do DSM-V, de cinco ou mais dias de autolesões para determinação do comportamento autolesivo como diagnóstico. Apenas um estudo apresentou os resultados fazendo distinção de ambos os critérios, classificando os adolescentes em grupos, disponibilizando dados referentes a ambos os adolescentes classificados mediante nenhuma autolesão versus uma autolesão não-suicida versus cinco ou mais dias de autolesão não-suicida [7

7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
].

A respeito dos meios para coleta de dados, dois estudos utilizaram como base a Ficha de Notificação de Violência Interpessoal e Autoprovocada [3, 

3. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
13
13. Tricco AC, Lillie E, Zarin W, O'Brien KK, Colquhoun H, Levac D, Moher D, Peters MDJ, Horsley T, Weeks L, Hempel S, Akl EA, Chang C, McGowan J, Stewart L, Hartling L, Aldcroft A, Wilson MG, Garritty C, Lewin S, Godfrey CM, Macdonald MT, Langlois EV, Soares-Weiser K, Moriarty J, Clifford T, Tunçalp Ö, Straus SE. PRISMA extension for scoping reviews (PRISMA-ScR): checklist and explanation. Ann Intern Med. 2018;169(7):467-73. https://doi.org/10.7326/m18-0850 PMID:30178033
], outros estudos utilizaram como base a ECA [16
16. Fonseca ACS. Caracterização da violência autoprovocada na adolescência: notificação pública e indicadores clínicos [dissertação]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2022. https://lume.ufrgs.br/handle/10183/249895
]
, um estudo utilizou os dados disponíveis nos prontuários do CAPSI [15
15. Santo MAS, Bedin LM, Dell’Aglio DD. Self-injurious behavior and factors related to suicidal intent among adolescents: a documentary study. Psico-USF. 2022;27(2):357-68. https://doi.org/10.1590/1413-82712022270212
]
, e outro estudo recorreu à construção de um questionário autoaplicável com as variáveis de interesse mediante avaliação da literatura [8
8. Pattussi MP, Lalloo R, Bassani DG, Olinto MT. The role of psychosocial, behavioural and emotional factors on self-reported major injuries in Brazilian adolescents: a case-control study. Injury. 2008;39(5):561-9. https://doi.org/10.1016/j.injury.2007.11.013 PMID:18339390
]
.

Características sociodemográficas e clínicas apresentadas nos artigos

A maioria dos artigos apresentaram a distribuição das variáveis sociodemográficas para amostra total estudada, a partir de análise descritiva. As únicas variáveis sociodemográficas presentes em todos os artigos foram Sexo e Faixa etária. Ao todo, foram estudados 2.032 adolescentes, em paralelo a mais de 15 mil casos notificados de comportamentos autolesivos.

O sexo feminino correspondeu a 51,3% da amostra total e a faixa de idade variou de 10 a 19 anos. A variável Escolaridade constou em três dos seis estudos, revelando que a maioria dos adolescentes se encontravam no ensino fundamental (6º ao 9º ano), com alguns cursando até o 3º ano do ensino médio [7, 

7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
15, 
15. Santo MAS, Bedin LM, Dell’Aglio DD. Self-injurious behavior and factors related to suicidal intent among adolescents: a documentary study. Psico-USF. 2022;27(2):357-68. https://doi.org/10.1590/1413-82712022270212
16
16. Fonseca ACS. Caracterização da violência autoprovocada na adolescência: notificação pública e indicadores clínicos [dissertação]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2022. https://lume.ufrgs.br/handle/10183/249895
].

A variável Raça/cor foi incluída em quatro estudos para caracterizar a amostra total [7 – 9, 

7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
14
14. Aragão CMC, Mascarenhas MDM. Temporal trend of adolescent intentional self-harm notifications in the school environment, Brazil, 2011-2018. Epidemiol Serv Saude. 2022;31(1):e2021820. https://doi.org/10.1590/s1679-49742022000100028 PMID:35544870
]. Os estudos com dados primários [7, 
7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
8
8. Pattussi MP, Lalloo R, Bassani DG, Olinto MT. The role of psychosocial, behavioural and emotional factors on self-reported major injuries in Brazilian adolescents: a case-control study. Injury. 2008;39(5):561-9. https://doi.org/10.1016/j.injury.2007.11.013 PMID:18339390
]
apresentaram percentual acima de 60% de não-brancos, enquanto os estudos com dados secundários [9, 
9. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
14
14. Aragão CMC, Mascarenhas MDM. Temporal trend of adolescent intentional self-harm notifications in the school environment, Brazil, 2011-2018. Epidemiol Serv Saude. 2022;31(1):e2021820. https://doi.org/10.1590/s1679-49742022000100028 PMID:35544870
]
de notificações do agravo apresentaram mais da metade das notificações como sendo de adolescentes brancos.

Apenas um estudo apresentou a variável Orientação Sexual [15

15. Santo MAS, Bedin LM, Dell’Aglio DD. Self-injurious behavior and factors related to suicidal intent among adolescents: a documentary study. Psico-USF. 2022;27(2):357-68. https://doi.org/10.1590/1413-82712022270212
], com 23,7% dos adolescentes do estudo declarando orientação não-heterossexual e um elevado percentual de ignorados para essa variável (41,0%). Com relação à Classe social e/ou Salários Mínimos (SM), apenas dois artigos abordaram os aspectos socioeconômicos dos adolescentes e suas famílias, expondo o predomínio das classes mais baixas e de famílias que recebem menos que 1 salário mínimo [7, 
7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
8
8. Pattussi MP, Lalloo R, Bassani DG, Olinto MT. The role of psychosocial, behavioural and emotional factors on self-reported major injuries in Brazilian adolescents: a case-control study. Injury. 2008;39(5):561-9. https://doi.org/10.1016/j.injury.2007.11.013 PMID:18339390
]
.

O mesmo estudo que abordou renda familiar, também incluiu outras variáveis interessantes, expondo diferenças significativas entre os grupos nenhuma autolesão versus uma autolesão versus cinco ou mais dias de autolesão para as variáveis Sexo, Renda familiar (<1 SM, 3 a 5SM), Atividade (Apenas estuda; Estuda e trabalha), Mora com o Pai [7

7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
]. A variável Zona de residência esteve descrita em ambos os estudos com dados secundários, demonstrando predominância de adolescentes residentes da zona urbana [9, 
9. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
14
14. Aragão CMC, Mascarenhas MDM. Temporal trend of adolescent intentional self-harm notifications in the school environment, Brazil, 2011-2018. Epidemiol Serv Saude. 2022;31(1):e2021820. https://doi.org/10.1590/s1679-49742022000100028 PMID:35544870
]
. Em um dos artigos, foi citada a presença de deficiência enquanto variável de estudo, compondo o percentual de 16,7% da amostra estudada [9
9. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
]
.

Do total de adolescentes, 648 (31,9%) apresentavam relato de comportamento autolesivo. A expressão de autolesão sem intenção suicida correspondeu a 49,5% (321) dos adolescentes com comportamento autolesivo e 15,8% da amostra total de adolescentes.

Um estudo destacou a variável idade na primeira autolesão, expondo pouco mais da metade das primeiras autolesões ocorrendo na adolescência, tendo também um elevado percentual ocorrido ainda na infância [15

15. Santo MAS, Bedin LM, Dell’Aglio DD. Self-injurious behavior and factors related to suicidal intent among adolescents: a documentary study. Psico-USF. 2022;27(2):357-68. https://doi.org/10.1590/1413-82712022270212
]. Os adolescentes com comportamento autolesivo não-suicida utilizavam dois ou mais tipos de lesão autoinfligida, tendo como principais métodos: morder-se, cutucar ferimentos, bater-se, cortar-se [7, 
7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
10
10. Fonseca PHN, Silva AC, Araújo LMC, Botti NCL. Autolesão sem intenção suicida entre adolescentes. Arq Bras Psicol. 2028;70(3):246-58. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672018000300017
]
. Dois estudos abordaram quantitativamente as motivações para autolesão, sendo as mais citadas pelos adolescentes: aliviar sensações de vazio ou indiferença; e parar sentimentos ou sensações ruins [7, 
7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
10
10. Fonseca PHN, Silva AC, Araújo LMC, Botti NCL. Autolesão sem intenção suicida entre adolescentes. Arq Bras Psicol. 2028;70(3):246-58. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672018000300017
]
.

Ademais, características clínicas como impulsividade, solidão e uso de álcool foram evidenciados nos estudos. Os adolescentes que apresentavam comportamento autolesivo, independente do quantitativo de vezes da ação, apresentavam maiores escores de impulsividade e solidão do que os adolescentes que não apresentaram qualquer comportamento autolesivo (P ≤ 0,05) [7

7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
]. O uso de álcool, por sua vez, ao ser relatado, mostrou-se uma evidência significativa diferindo entre os sexos, apresentando maiores medidas para o sexo masculino, em ambas as estratificações etárias (10 a 14 e 15 a 19 anos, p<0,001) [3
3. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
]
.

Por fim, um estudo apresentou 12.060 internações de adolescentes por autolesão entre 2007 e 2016, havendo predominância do sexo feminino (58,1%) e maior ocorrência na região Sudeste (2,7 e 7,0 notificações/100 mil habitantes, nos grupos etários de 10-14 e 15-19 anos, respectivamente) [3

3. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
]. O Quadro 2 sintetiza as vaiáveis de caracterização sociodemográfica e psicossocial encontradas nos estudos.

Discussão

Observou-se na literatura científica que aborda a temática das lesões auto provocadas, que estas são motivo de preocupação coletiva [13

13. Tricco AC, Lillie E, Zarin W, O'Brien KK, Colquhoun H, Levac D, Moher D, Peters MDJ, Horsley T, Weeks L, Hempel S, Akl EA, Chang C, McGowan J, Stewart L, Hartling L, Aldcroft A, Wilson MG, Garritty C, Lewin S, Godfrey CM, Macdonald MT, Langlois EV, Soares-Weiser K, Moriarty J, Clifford T, Tunçalp Ö, Straus SE. PRISMA extension for scoping reviews (PRISMA-ScR): checklist and explanation. Ann Intern Med. 2018;169(7):467-73. https://doi.org/10.7326/m18-0850 PMID:30178033
], tendo em vista o grave desfecho associado a este comportamento que são as tentativas de suicídio [16
16. Fonseca ACS. Caracterização da violência autoprovocada na adolescência: notificação pública e indicadores clínicos [dissertação]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2022. https://lume.ufrgs.br/handle/10183/249895
]
. Contudo, percebe-se que existe uma escassez de publicações acerca deste comportamento praticado especificamente no público brasileiro, produzindo dados pouco precisos acerca do tema.

As características sociodemográficas da população estudada sofreu limitações secundárias a enorme heterogeneidade dos dados publicados. Contudo, a variável categórica sexo foi vista em todos os estudos incluídos na revisão, sendo as meninas mais vulneráveis a estes acontecimentos. Porém, um dos artigos evidenciou uma leve prevalência no grupo do sexo masculino [8

8. Pattussi MP, Lalloo R, Bassani DG, Olinto MT. The role of psychosocial, behavioural and emotional factors on self-reported major injuries in Brazilian adolescents: a case-control study. Injury. 2008;39(5):561-9. https://doi.org/10.1016/j.injury.2007.11.013 PMID:18339390
]. Destarte, vale estudar de forma mais aprofundada as causas biológicas, psíquicas e sociais, para que se possa entender melhor esta variável.

Boa parte das auto lesões iniciaram antes dos 12 anos de idade [15

15. Santo MAS, Bedin LM, Dell’Aglio DD. Self-injurious behavior and factors related to suicidal intent among adolescents: a documentary study. Psico-USF. 2022;27(2):357-68. https://doi.org/10.1590/1413-82712022270212
]. Contudo, os dados encontrados foram escassos quanto ao período de 10 a 12 anos e infância, limitando o conhecimento de determinantes epidemiológicos precoces que possam promover a prevenção. Além disto, percebeu-se que a idade média mais vulnerável foi até 14 anos [7
7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
]
. Apesar do ambiente em que ocorrem o atos auto-lesivos nãos suicidas não terem sido evidenciados nos trabalhos publicados, é de interesse público o conhecimento do mesmo. Tendo em vista que na escola houve um predomínio desta atitude de risco, chegando a 87,8% destes pertencentes da 5ª série do ensino Fundamental até 3º ano do Ensino Médio [14
14. Aragão CMC, Mascarenhas MDM. Temporal trend of adolescent intentional self-harm notifications in the school environment, Brazil, 2011-2018. Epidemiol Serv Saude. 2022;31(1):e2021820. https://doi.org/10.1590/s1679-49742022000100028 PMID:35544870
]
. Ademais é no ambiente escolar que deverá ser o local de maior possibilidade de se encontrar a população estudada.

A renda, escolaridade e raça foram menos padronizadas nas publicações. Estes achados são de extrema importância social e em saúde coletiva para a construção de estratégias específicas de prevenção e intervenção para o público-alvo deste estudo. Sendo referido, em apenas um artigo, todas estas variáveis citadas [7

7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
].

No tocante às condições clínicas, observou-se que a tentativa de “alívio” foi citado em dois trabalhos como importante componente cognitivo dos praticantes destes atos, que podem apresentar-se de maneiras variadas, desde coçar-se até corte, uso de arma de fogo dentre outras [7, 

7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040
14
14. Aragão CMC, Mascarenhas MDM. Temporal trend of adolescent intentional self-harm notifications in the school environment, Brazil, 2011-2018. Epidemiol Serv Saude. 2022;31(1):e2021820. https://doi.org/10.1590/s1679-49742022000100028 PMID:35544870
]. Entretanto, não houve destaque quanto as motivações, nem as formas de execução, limitando a possibilidade de promoção de estratégias de enfrentamento emocional dos mesmos.Alguns transtornos psiquiátricos foram citados, tais como depressão, abuso de álcool e traços de personalidade borderline [3
3. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879
]
. Percebeu-se, porém, pouca descrição de dados clínicos mais específicos associados, como prevalência, principais sintomas de alerta, sinais precoces, sabendo-se que estes constituem motivo para tratamento precoce pelos especialistas.

Uma problemática relevante sobre esta temática é referente às notificações, pois os sistemas brasileiros de notificação de agravos são pouco valorizados e subnotificação dificulta o conhecimento da realidade brasileira [15

15. Santo MAS, Bedin LM, Dell’Aglio DD. Self-injurious behavior and factors related to suicidal intent among adolescents: a documentary study. Psico-USF. 2022;27(2):357-68. https://doi.org/10.1590/1413-82712022270212
]. Acrescente-se a isto o fato de que não é possível através do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) caracterizar a intencionalidade do ato [17
17. Asarnow JR, Porta G, Spirito A, Emslie G, Clarke G, Wagner KD, Vitiello B, Keller M, Birmaher B, McCracken J, Mayes T, Berk M, Brent DA. Suicide attempts and nonsuicidal self-injury in the treatment of resistant depression in adolescents: findings from the TORDIA study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry. 2011;50(8):772-81. https://doi.org/10.1016/j.jaac.2011.04.003 PMID:21784297 - PMCID:PMC3143365
]
. Isto é de fundamental importância ao diferenciar os atos auto-lesivos não suicidas daqueles com intenção suicida que caracterizam-se como tentativas de suicídio. Ademais, as subnotificações ocorridas no período da pandemia de COVID-19 limitou não apenas o conhecimento do panorama real do problema em questão, como os impactos deste episódio na vida do adolescente brasileiro [15
15. Santo MAS, Bedin LM, Dell’Aglio DD. Self-injurious behavior and factors related to suicidal intent among adolescents: a documentary study. Psico-USF. 2022;27(2):357-68. https://doi.org/10.1590/1413-82712022270212
]
.

Notou-se, também, uma falta de dados sociodemográficos e clínicos nos artigos revisados sobre os adolescentes brasileiros durante e após a pandemia de COVID-19, a qual, devido a necessidade de isolamento, medo da morte, excesso do uso de telas impactou esta população, especialmente com aumento de ansiedade [18

18. Guerreiro DF, Sampaio D. Deliberate self-harm in adolescents: literature review with focus on Portuguese language research. Rev Port Saude Publica. 2013;31(2):204-13. https://doi.org/10.1016/j.rpsp.2013.05.001
]. Consequentemente no agravamento da saúde mental isto pode ser visto, mesmo nos artigos publicados nos anos de 2020 a 2023, pois estes usaram dados com população vivendo o período anterior [19
19. Araújo LA, Veloso CF, Souza MC, Azevedo JMC, Tarro G. The potential impact of the COVID-19 pandemic on child growth and development: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2021;97(4):369-77. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.08.008 PMID:32980318 - PMCID:PMC7510529
]
.

Agradecimento

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001

Referências

1. American Psychiatric Association. Diagnostic and statistical manual of mental disorders: DSM-5. 5th rev. ed. Washington: American Psychiatric Association; 2022. https://doi.org/10.1176/appi.books.9780890425787

2. Monteiro RA, Bahia CA, Paiva EA, Sá NNB, Minayo MCS. Hospitalizations due to self-inflicted injuries - Brazil, 2002 to 2013. Ciênc Saude Coletiva. 2015;20(3):689–99. https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.16282014

3. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879

4. Brañas MJAA, Croci MS, Murray GE, Choi-Kain LW. The relationship between self-harm and suicide in adolescents and young adults. Psychiatr Ann. 2022;52(8):311-7. https://doi.org/10.3928/00485713-20220715-01

5. Wilkinson P, Kelvin R, Roberts C, Dubicka B, Goodyer I. Clinical and psychosocial predictors of suicide attempts and nonsuicidal self-injury in the Adolescent Depression Antidepressants and Psychotherapy Trial (ADAPT). Am J Psychiatry. 2011;168(5):495-501. https://doi.org/10.1176/appi.ajp.2010.10050718

6. Bandeira BES, Santos Júnior A, Dalgalarrondo P, Azevedo RCS, Celeri EHVR. Nonsuicidal self-injury in undergraduate students: a cross-sectional study and association with suicidal behavior. Psychiatry Res. 2022;318:114917. https://doi.org/10.1016/j.psychres.2022.114917

7. Costa RPO, Peixoto ALRP, Lucas CCA, Falcão DN, Farias JTDS, Viana LFP, Pereira MAA, Sandes MLB, Lopes TB, Mousinho KC, Trindade-Filho EM. Profile of non-suicidal self-injury in adolescents: interface with impulsiveness and loneliness. J Pediatr (Rio J). 2021;97(2):184-90. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.01.006 PMID:32151605 - PMCID:PMC9432040

8. Pattussi MP, Lalloo R, Bassani DG, Olinto MT. The role of psychosocial, behavioural and emotional factors on self-reported major injuries in Brazilian adolescents: a case-control study. Injury. 2008;39(5):561-9. https://doi.org/10.1016/j.injury.2007.11.013 PMID:18339390

9. Bahia CA, Avanci JQ, Pinto LW, Minayo MCS. Adolescent intentional self-harm notifications and hospitalizations in Brazil, 2007-2016. Epidemiol Serv Saude. 2020;29(2):e2019060. https://doi.org/10.5123/s1679-49742020000200006 PMID:32401879

10. Fonseca PHN, Silva AC, Araújo LMC, Botti NCL. Autolesão sem intenção suicida entre adolescentes. Arq Bras Psicol. 2028;70(3):246-58. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672018000300017

11. Ribeiro ACOP, Leite RFD, Couto VVD. Autolesão em estudantes adolescentes de uma escola pública pública. Rev Família Ciclos de Vida e Saude no Contexto Social. 2022;10(1):135-44. https://doi.org/10.18554/refacs.v10i1.5000

12. Arksey H, O'Malley L. Scoping studies: towards a methodological framework. Int J Soc Res Methodol. 2005;8(1):19-32. https://doi.org/10.1080/1364557032000119616

13. Tricco AC, Lillie E, Zarin W, O'Brien KK, Colquhoun H, Levac D, Moher D, Peters MDJ, Horsley T, Weeks L, Hempel S, Akl EA, Chang C, McGowan J, Stewart L, Hartling L, Aldcroft A, Wilson MG, Garritty C, Lewin S, Godfrey CM, Macdonald MT, Langlois EV, Soares-Weiser K, Moriarty J, Clifford T, Tunçalp Ö, Straus SE. PRISMA extension for scoping reviews (PRISMA-ScR): checklist and explanation. Ann Intern Med. 2018;169(7):467-73. https://doi.org/10.7326/m18-0850 PMID:30178033

14. Aragão CMC, Mascarenhas MDM. Temporal trend of adolescent intentional self-harm notifications in the school environment, Brazil, 2011-2018. Epidemiol Serv Saude. 2022;31(1):e2021820. https://doi.org/10.1590/s1679-49742022000100028 PMID:35544870

15. Santo MAS, Bedin LM, Dell’Aglio DD. Self-injurious behavior and factors related to suicidal intent among adolescents: a documentary study. Psico-USF. 2022;27(2):357-68. https://doi.org/10.1590/1413-82712022270212

16. Fonseca ACS. Caracterização da violência autoprovocada na adolescência: notificação pública e indicadores clínicos [dissertação]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2022. https://lume.ufrgs.br/handle/10183/249895

17. Asarnow JR, Porta G, Spirito A, Emslie G, Clarke G, Wagner KD, Vitiello B, Keller M, Birmaher B, McCracken J, Mayes T, Berk M, Brent DA. Suicide attempts and nonsuicidal self-injury in the treatment of resistant depression in adolescents: findings from the TORDIA study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry. 2011;50(8):772-81. https://doi.org/10.1016/j.jaac.2011.04.003 PMID:21784297 - PMCID:PMC3143365

18. Guerreiro DF, Sampaio D. Deliberate self-harm in adolescents: literature review with focus on Portuguese language research. Rev Port Saude Publica. 2013;31(2):204-13. https://doi.org/10.1016/j.rpsp.2013.05.001

19. Araújo LA, Veloso CF, Souza MC, Azevedo JMC, Tarro G. The potential impact of the COVID-19 pandemic on child growth and development: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2021;97(4):369-77. https://doi.org/10.1016/j.jped.2020.08.008 PMID:32980318 - PMCID:PMC7510529

Debates em Psiquiatria, Rio de Janeiro. 2025