Filiação dos autores:
1 [Psiquiatra, mestre em Saúde Integral pelo IMIP, tutor do curso de Medicina na Faculdade Pernambucana de Saúde, FPS, Recife, PE, Brasil];
2 [Psicóloga, mestre em Educação para o Ensino na Área de Saúde pela Faculdade Pernambucana de Saúde, FPS, Recife, PE, Brasil];
3, 4, 5 [Graduandos, Faculdade Pernambucana de Saúde, FPS, Recife, PE, Brasil]
Editor-chefe responsável pelo artigo: Marsal Sanches
Contribuição dos autores segundo a Taxonomia CRediT: Rodrigues AFA [1,2,3,5,6,7,10,11,12,13,14], Sampaio MAL [1,10,12,13,14], Moraes MAM, Coêlho MA, Almeida Filho KH [1,2,5,6,7,11,12,13,14]
Conflito de interesses: declaram não haver
Fonte de financiamento: declaram não haver
Parecer CEP: Faculdade Pernambucana de Saúde, Associação Educacional de Ciências da Saúde, AECISA, Parecer n. 5.738.503 - CAAE: 64582622.9.0000.5569
Recebido em: 03/06/2024 | Aprovado em: 11/11/2024 | Publicado em: 21/11/2024
Como citar: Rodrigues AFA, Sampaio MAL, Moraes MAM, Coêlho MA, Almeida Filho KH. Avaliação de sintomas de ansiedade entre atletas da seleção brasileira de futebol americano: um estudo descritivo. Debates em Psiquiatria, Rio de Janeiro. 2024;14:1-19. https://doi.org/10.25118/2763-9037.2024.v14.1266
Introdução: Ser atleta de elite envolve sacrifícios e grande pressão, expondo-os a riscos mentais, como depressão, uso de substâncias e ansiedade. No futebol americano, popular nos EUA e em crescimento no Brasil, a saúde mental dos atletas é pouco estudada. O presente estudo busca avaliar a prevalência de sintomas de ansiedade entre jogadores brasileiros de futebol americano. Objetivos: O objetivo do estudo é descrever a prevalência de sintomas de ansiedade em atletas das Seleções Brasileiras de futebol americano (masculina e feminina) em 2022, associando esses sintomas a dados sociodemográficos, atléticos e de saúde. Métodos: Foi realizado um estudo observacional transversal com 61 atletas das seleções brasileiras de futebol americano. Os dados foram coletados entre junho e agosto de 2023, através de questionários online, incluindo um questionário sociodemográfico e a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HADS). A análise utilizou testes estatísticos, como o qui-quadrado de Pearson e o teste t de amostras independentes. Resultados: A amostra, composta por atletas com idade média de 29,2 anos, identificou que 44,3% apresentaram sintomas de ansiedade. Os principais fatores de risco associados foram ser do sexo masculino, ser mais jovem e ter menor tempo de prática no esporte. Conclusão: Os resultados sugerem que sexo, idade e experiência no esporte influenciam os níveis de ansiedade nos atletas de futebol americano no Brasil. Esses achados ampliam a compreensão dos desafios mentais enfrentados por essa população e reforçam a necessidade de maior suporte para o desenvolvimento profissional da modalidade no país.
Palavras-chave: atletas, ansiedade, futebol americano, saúde mental.
Introduction: Being an elite athlete involves sacrifices and great pressure, exposing them to mental health risks such as depression, substance use, and anxiety. In American football, popular in the U.S. and growing in Brazil, athletes' mental health is still under-researched. This study aims to assess the prevalence of anxiety symptoms among Brazilian American football players. Objectives: The objective of the study is to describe the prevalence of anxiety symptoms in athletes from the Brazilian national American football teams (both male and female) in 2022, associating these symptoms with sociodemographic, athletic, and health-related data. Methods: An observational cross-sectional study was conducted with 61 athletes from the Brazilian national American football teams. Data were collected between June and August 2023 through online questionnaires, including a sociodemographic questionnaire and the Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS). The analysis used statistical tests, such as Pearson's chi-square and independent samples t-tests. Results: The sample, composed of athletes with an average age of 29.2 years, found that 44.3% showed symptoms of anxiety. The main associated risk factors were being male, younger age, and having less time practicing the sport. Conclusion: The results suggest that sex, age, and experience in the sport influence anxiety levels in Brazilian American football athletes. These findings expand the understanding of the mental health challenges faced by this population and emphasize the need for greater support for the professional development of the sport in the country.
Keywords: athletes, anxiety, american football, mental health.
Introducción: Los atletas de élite enfrentan grandes presiones y sacrificios, lo que los expone a riesgos mentales como la depresión, el uso de sustancias y la ansiedad. En el fútbol americano, un deporte popular en los Estados Unidos y en crecimiento en Brasil, la salud mental de los jugadores ha sido poco investigada. Este estudio se enfoca en evaluar la prevalencia de ansiedad entre los jugadores brasileños de fútbol americano. Objetivos: El objetivo es describir la prevalencia de síntomas de ansiedad en los atletas de las selecciones brasileñas de fútbol americano (masculina y femenina) en 2022, y analizar la relación de estos síntomas con variables sociodemográficas, atléticas y de salud. Métodos: Se llevó a cabo un estudio transversal con 61 atletas de las selecciones brasileñas de fútbol americano. Los datos se recolectaron mediante cuestionarios en línea entre junio y agosto de 2023, que incluían preguntas sociodemográficas y la Escala Hospitalaria de Ansiedad y Depresión (HADS). Se utilizaron pruebas estadísticas como el chi-cuadrado de Pearson y la prueba t para muestras independientes. Resultados: El 44,3% de los atletas mostró síntomas de ansiedad. Los factores de riesgo principales fueron el ser hombre, más joven y con menor tiempo practicando el deporte. Conclusión: El sexo, la edad y la experiencia influyen en los niveles de ansiedad de los atletas de fútbol americano en Brasil. Estos resultados destacan la importancia de un mayor apoyo para el desarrollo profesional del deporte en el país.
Palabras clave: atletas, ansiedad, fútbol americano, salud mental.
Uma das formas de compreender o atleta é através de sua identidade atlética a qual pode ser entendida como uma forma de existir psicologicamente centrado em performance e resultado. Por causa disso, rotinas extenuantes de treino, viagens para competição e pressão por performance fazem parte da vida de um atleta que compete em alto nível. Identificar-se como tal está atrelado a determinadas traços característicos que, a depender de como se aborde, podem ser positivos ou negativos. Por exemplo, um atleta pode se beneficiar no esporte por tomar risco, enquanto fora dele, pode levá-lo a situações arriscadas, como uma possível dependência a substâncias psicoativas.
Por causa disso, é necessário avaliar os aspectos mentais dessa população de modo ampliado, compreendendo que eles estão expostos a fatores de risco para o desenvolvimento de transtornos mentais assim como a população em geral, mas também eles são expostos a um ecossistema do esporte que engloba outros fatores de risco, como a relação com treinadores, mídia, lesões, pressão para dar resultado. Dessa forma, a prevalência de transtornos mentais nessa população parece ser igual ou até mesmo aumentada quando comparado à população geral. Dentre os transtornos mais prevalentes observa-se a depressão, uso nocivo de álcool e outras substâncias, problemas de sono, transtornos alimentares e ansiedade .
A ansiedade em atletas não está relacionada somente à ansiedade de performance. Eles podem sofrer com transtorno de ansiedade generalizada, de pânico, de ansiedade social, entre outros. Em pesquisa que avaliou os últimos 6 meses dos atletas, foi evidenciado que 9% dos atletas sofrem de algum tipo de ansiedade. Entre os atletas, pode-se dividir os fatores de risco em esportivos e não esportivos. Em relação aos esportivos, concussões e lesões musculoesqueléticas, escrutínio público, pressão por performance, além de assédio e abuso são importantes fatores de risco. Já os não esportivos, ser do sexo feminino, jovem, menor religiosidade, evento adverso recente na vida, compõem parte desses fatores. Por outro lado, força mental e satisfação com o esporte podem ser encarados como fatores protetores para o desenvolvimento de sintomas ansiosos.
Dentre todas as modalidades praticadas, o futebol americano, apesar de ser um esporte conhecido mundialmente, ainda é pouco praticado fora dos Estados Unidos, local onde foi criado. Lá é o esporte mais assistido e praticado pelos norte-americanos, tanto no âmbito profissional quanto no âmbito universitário. Já no Brasil, o esporte começou a se popularizar por volta da década de 90, sendo jogado nas praias do Rio de Janeiro. O estado foi o primeiro a ter um campeonato, ocorrendo, na época, ainda na praia e sendo organizado pelas próprias equipes participantes. O futebol americano praticado no Brasil atingiu, no ano de 2019, a marca de 214 times nacionais, totalizando, aproximadamente, 12250 atletas. No entanto, apesar do crescimento, o esporte ainda se encontra em contexto amador, de caráter participativo e informal. Atualmente, a Confederação Brasileira de Futebol Americano (CBFA) é reconhecida pela International Federation of American Football (IFAF – Federação Internacional de Futebol Americano) como o órgão máximo do futebol americano em território nacional, além de gerenciar e ser responsável pelas Seleções Brasileiras de futebol americano (Brasil Onças e Brasil Onças Feminino).
Por causa disso, dados a respeito dessa população ainda são escassos. A principal fonte de dados provém dos Estados Unidos, local que possui a National Football League (NFL), maior competição mundial da modalidade, e do esporte universitário e de ensino médio que possuem a cultura de pratica a modalidade de forma competitiva. Nesses cenários, foi possível relacionar a prevalência aumentada de ansiedade a histórico de concussão, ser da raça negra, baixo suporte social durante recuperação de lesão, entre outros. Já no Brasil, foi avaliado, a partir de uma amostra de 46 atletas que jogavam em uma equipe participante da Liga Nordeste, que existe uma associação entre sintomas de exaustão física e emocional com pensamentos negativos .
Diante desse contexto, percebe-se que a literatura científica, apesar de estar evoluindo no entendimento do contexto da saúde mental no esporte, ainda é escassa sobre o futebol americano, mas também à sua relação com a ansiedade. Dessa forma, o presente estudo avalia a prevalência de sintomas de ansiedade em atletas de futebol americano do sexo masculino e feminino no Brasil.
Trata-se de estudo epidemiológico observacional descritivo do tipo transversal, realizado via internet, através de questionários enviados através de e-mail. A população estudada é composta por atletas de futebol americano do sexo masculino e feminino que atuaram no ano de 2022 nas Seleções Brasileiras masculina e feminina de futebol americano representadas pelos times Brasil Onças e Brasil Onças Feminino. A amostragem foi realizada por conveniência, no qual 108 atletas foram convidados, porém apenas 61 responderam. A coleta foi realizada entre os meses de junho e agosto de 2023. Foram incluídos atletas adultos de ambos os gêneros que haviam sido convocados pela Confederação Brasileira de Futebol Americano para a seleção brasileira de futebol americano. Não foi instituído nenhum critério de exclusão para a amostra.
Os contatos dos atletas foram cedidos pela Confederação Brasileira de Futebol Americano. Eles foram contactados através de e-mail e de suas redes sociais e convidados a participar da pesquisa. Aos que responderam positivamente, foi enviado um link do Google Forms contendo o termo de consentimento livre e esclarecido, o questionário sociodemográfico, além da escala hospitalar de ansiedade e depressão, instrumento escolhido para a avaliação dos sintomas ansiosos.
A Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão é dividida em duas subescalas, uma para ansiedade (HADS-A) e outra para depressão (HADS-D). Cada subescala possui 7 itens que pontuam de 0 a 3, podendo, o participante, pontuar de 0 a 21 no total em cada subescala. Cada item é formulado como pergunta de múltipla escolha, em que o participante deve responder de acordo com o que ele sentiu na última semana.
A respeito da avaliação dos resultados da HADS, seus criadores Zigmond e Snaith definiram que resultados maiores que 8, em cada subescala, fossem considerados casos possíveis, resultados maiores que 11 fossem considerados prováveis e aqueles maiores que 15 como distúrbios graves. Porém, na tradução e validação da HADS para o português, Botega et al., responsáveis por tal feito, definiram que os resultados menores que 8 em cada subescala seriam considerados como ausência de sintomas de ansiedade e depressão, ao passo que resultados iguais ou maiores que 8 seriam considerados como presença de sintomas de ansiedade e depressão. Ressalta-se que apesar de ter sido desenvolvida para contexto hospitalar, essa escala já foi validada e utilizada em contextos extra-hospitalares, inclusive para a avaliação de atletas.
As variáveis utilizadas foram divididas em categorias, sendo elas: sociodemográficas (idade, sexo, raça/cor, estado civil, religião, escolaridade e renda familiar total), referentes ao esporte (futebol americano como atividade remunerada, dedicação exclusiva ao esporte, dias de treinamento físico na semana, tempo de treinamento físico na semana, tempo de treinamento cognitivo/intelectual por semana, tempo de prática do esporte, posição principal na Seleção Brasileira, tipo de equipe principal na Seleção Brasileira, lesão atual e tempo de lesão) e psíquicas (HADS-A).
Foi realizada uma análise descritiva das variáveis sociodemográficas, atléticas e de saúde mental presentes no estudo. As variáveis foram selecionadas para identificar possíveis fatores de risco associados ao desenvolvimento de sintomas ansiosos em atletas. Para avaliar a relação entre uma variável quantitativa e variáveis qualitativas foram utilizadas medidas de posição (média e mediana) e de dispersão (desvio padrão, mínimo e máximo) da variável quantitativa para cada grupo da variável qualitativa. Para examinar associações entre variáveis categóricas, utilizou-se o teste qui-quadrado de Pearson. Além disso, foram realizados testes t de amostras independentes para comparar médias de variáveis contínuas entre grupos de ansiedade. Para as análises foram adotados um nível de significância estatística de 5%.
Quanto aos aspectos éticos da pesquisa, foram consideradas as prerrogativas da resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, sendo o presente estudo aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade Pernambucana de Saúde em 03/11/2022, tendo início somente após sua aprovação (CAAE: 64582622.9.0000.5569).
A amostra final foi constituída por 61 atletas que apresentou uma idade média de 29,2 ± 4,7 anos, sendo o mais jovem com 21 anos, enquanto o mais velho possuía 43. A maioria dela é branca, solteira, de religião que não católico/evangélico/espírita, com ensino superior completo, renda familiar acima de 3 salários-mínimos, não recebem qualquer valor para praticar futebol americano e, além de praticar futebol americano, estudam e trabalham. A maioria dos atletas não apresentavam lesão atualmente. Entre os atletas lesionados, a média de semanas com lesão foi de 6,3 com desvio-padrão (DP) de ± 6,7 semanas, sendo o mínimo de 1 semana de lesão e o máximo de 16 semanas lesionado. A rotina de treinamentos desses atletas está descrita na Tabela 1.
Verificou-se que 27 atletas (44,3%) possuíam sintomas sugestivos de ansiedade. Os resultados estão descritos na Tabela 2. Ao se analisar as características qualitativas sociodemográficas e atléticas dessa população e os sintomas ansiosos, observou-se que apenas o sexo teve significância estatística (p=0,027), sendo o masculino um fator de risco.
Também foi avaliada a relação entre variáveis qualitativas e quantitativas com os resultados presentes na Tabela 3. Houve correlação com relevância estatística entre a prevalência de sintomas de ansiedade e a idade em anos completos dos atletas (p=0,006). Atletas sem sintomas ansiosos apresentaram média de idade de 30,6 anos ± 4,5 ao passo que atletas com sintomas ansiosos eram mais jovens, com uma média de 27,3 anos ± 4,4. Além disso, a análise da quantidade de anos praticando futebol americano e a prevalência de sintomas ansiosos revelou maior prevalência de sintomas ansiosos em jogadores com menos anos de prática, sendo a média de anos praticados do grupo que não apresentou sintomas de 8,4 anos ± 4,4, ao passo que o grupo com sintomas apresentou média de 6,3 anos ± 3,0 (p=0,036). Ressalta-se que nas variáveis relativas a horas de estudo e dias de treinamento apenas 60 atletas responderam.
O presente estudo avaliou a presença de sintomas de ansiedade nos jogadores convocados para as Seleções Masculina (Brasil Onças) e Feminina (Brasil Onças Feminino) de Futebol Americano, no ano de 2022 e ficou evidenciado 44,3% dessa população apresentavam sintomas ansiosos, enquanto se observou que características como ser do sexo masculino, ser mais jovem e menos anos de prática do esporte podem ser consideradas fatores de risco para o desenvolvimento desses sintomas.
Sabe-se que a prevalência de transtornos ansiosos mundialmente é de aproximadamente 4% e no Brasil em torno de 8% mesmo após a pandemia de COVID-19 que inflou esses números. Desse modo, o trabalho evidenciou níveis bem mais elevados que a população geral. Ressalta-se que os dados de prevalência são a respeito de transtornos enquanto o presente trabalho avaliou sintomas. Já em relação à população atlética, nota-se que a prevalência está em linha com a literatura científica que mostra níveis de ansiedade iguais ou aumentados em atletas em relação à população geral. Estima-se que em torno de 9% dos atletas sofreram com algum tipo de transtorno de ansiedade nos últimos 6 meses. Por outro lado, quando avaliado apenas sintomas ansiosos, essa prevalência chega a 34%. É necessário ressaltar que a frequência encontrada no presente estudo é referente a sintomas ansiosos no geral, visto que a escala hospitalar de ansiedade e depressão é um instrumento de rastreio. Um confundidor nessa comparação é que as avaliações dos atletas utilizam questionários diversos. Por exemplo, em estudo realizado com atletas de elite universitários nos Estados Unidos e que se utilizou o instrumento Generalized Anxiety Disorder-7 (GAD-7), que avalia ansiedade generalizada, a frequência de sintomas ansiosos foi menor quando comparada ao presente estudo (22% x 44,3%). Essa situação também se repete em outros estudos que utilizaram a GAD-7 em população de atletas. Para minimizar essas discrepâncias e padronizar as avaliações de transtornos mentais em atletas, o comitê olímpico internacional desenvolveu o Sports Mental Health Assessment Tool-1 (SMHAT-1).
Um ponto observado que contradiz a literatura existente é em relação ao sexo. Observou-se que ser do sexo masculino foi fator de risco para o desenvolvimento de sintomas ansiosos. Esse dado contradiz os dados presentes na literatura que indicam o sexo feminino com fator de risco . Em estudos realizados com atletas universitários de elite nos Estados Unidos, as atletas do sexo feminino apresentaram níveis mais graves de ansiedade quando comparado aos do sexo masculino. O resultado encontrado no presente estudo também contradiz a prevalência da ansiedade na população geral em que ser do sexo feminino traz maior risco. É plausível levantar a possibilidade de que isso ocorre pois o cenário relativo à categoria feminina no Brasil se encontra em estágio ainda mais incipiente de desenvolvimento quando comparado à masculina, gerando menos fatores relacionados ao estresse esportivo.
Além disso, evidenciou-se que ter idade mais baixa constituiu-se como fator de risco para o desenvolvimento de ansiedade. Esse fato corrobora os dados da literatura científica sobre atletas. Em revisão que avaliou determinantes de ansiedade em atletas, ter idade menor que 25 anos foi considerado como fator de risco para desenvolvimento de ansiedade. Apesar disso, ressalta-se que no presente estudo a média de idade para desenvolvimento de sintomas ansiosos foi mais alta, em torno de 27,3 ± 4,4 anos. Um dos fatores que pode explicar essa diferença é que a média de idade dos atletas foi de 29,2 ± 4,7 anos o que pode ser considerada alta quando se compara com outros atletas performando em alto nível. Sabe-se que a carreira de um atleta pode começar desde a adolescência e, normalmente, se encerra durante a quarta década de vida. É possível que a situação ainda em desenvolvimento do esporte contribua para esse fato visto que 95% da população avaliada além de praticar o futebol americano, também estuda ou trabalha ou estuda e trabalha.
Por outro lado, ter menos anos de prática do esporte mostrou-se como fator de risco para o desenvolvimento de sintomas ansiosos. Isso sugere que a familiaridade e experiência no esporte podem desempenhar um papel crucial na regulação da ansiedade. Por outro lado, um estudo apontou que o tempo de prática do esporte não foi considerado fator de proteção para o desenvolvimento de ansiedade pré-competitiva. Quanto a esta divergência de resultados, o presente estudo contou com uma amostra maior, mais plural e em um contexto de maior exigência de performance. Dessa forma, é possível que algumas hipóteses para explicar a maior frequência de sintomas de ansiedade nos atletas com menos tempo de prática do esporte possam ser: o enfrentamento de novos desafios, a necessidade de se estabelecer na seleção, falta de experiência, fatores que, ao interagir em conjunto, podem resultar em sintomas ansiosos.
Uma das questões que deve ser levantada é a escassez de trabalhos entre esta população específica brasileira e a avaliação de sintomas de ansiedade. No Brasil, foi realizada uma pesquisa que abordou burnout e ansiedade pré-competitiva em jogadores de futebol americano de um time amador do Nordeste. A partir de uma amostra de 46 atletas que jogavam em uma equipe participante da Liga Nordeste, os pesquisadores encontraram uma associação entre sintomas de exaustão física e emocional com pensamentos negativos. Apesar de não ter sido avaliado sintomas de burnout no presente estudo, é necessário levar em consideração a alta prevalência de sintomas de ansiedade, visto que ela pode estar associada e contribuir para o desencadeamento ou piora da Síndrome de Burnout em atletas.
Deve-se ressaltar que os resultados encontrados apresentam suas limitações. É importante ressaltar que apesar de ter uma base crescente de praticantes ao redor do mundo, o futebol americano ainda é um esporte incipiente no Brasil, com uma prática profissional ainda em desenvolvimento. Uma das principais limitações consideradas e potencial confundidor na análise é que, mesmo avaliando atletas de elite do futebol americano brasileiro, apenas 4,9% deles se dedicam exclusivamente à prática esportiva. Dessa forma, apesar da compreensão de que fatores não-esportivos podem influenciar na saúde mental do atleta, é possível esses atletas estejam mais propensos a serem afetados por esses fatores de risco do que relacionado ao esporte e necessita ser investigado em momento posterior. Além disso, foi avaliado apenas ansiedade, sendo necessária a investigação de outros problemas como depressão, problemas com álcool, sono, transtornos dismórficos corporais, qualidade e tempo de sono, entre outros aspectos que podem acometer atletas em sua totalidade, devem ser pesquisadas posteriormente.
Em contrapartida, o atual estudo trouxe à tona características importantes a respeito da elite dos atletas de futebol americano, tanto sociodemográficas, como atléticas e a respeito da saúde mental deles. A partir dessa pesquisa, será possível delinear estratégias para melhor cuidar dessa população, assim como ajudar na potencialização de sua performance, a qual é uma área importante dentro da saúde mental no esporte.
Portanto, foi observado que ser do sexo masculino, ter menos de tempo de prática do futebol americano e ter idade mais baixa podem influenciar nos níveis de sintomas de ansiedade nos atletas da seleção brasileira de futebol americano. É importante frisar que essa pesquisa vem a somar a escassa literatura sobre essa população no Brasil e pode servir como fonte para melhor entender os problemas enfrentados por ela. Em seus dados sociodemográficos e de rotina atlética, o estudo também reforça a ideia de que, apesar de serem atletas competitivos, ainda há um caminho a percorrer para que esses atletas possam se dedicar exclusivamente ao esporte de maneira profissional e a modalidade possa se desenvolver.
Agradecemos a todos os atletas que se dispuseram a participar da nossa pesquisa. Sua participação foi vital para a realização deste estudo e, sem a sua contribuição, não teríamos alcançado os resultados que obtivemos.
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